A Alma Soul do Brasil: O Groove de Tim Maia e Jorge Ben Jor

Enquanto a MPB explorava a poesia, a política e a psicodelia, uma corrente paralela, mas igualmente poderosa, eletrificava o corpo e a alma da música brasileira. Inspirados pela força da música negra norte-americana de artistas como James Brown e Marvin Gaye, dois gênios cariocas, Tim Maia e Jorge Ben Jor, criaram uma sonoridade única, cheia de groove, que fundia o soul e o funk com o ritmo do samba. Eles foram os arquitetos da "música soul brasileira".

Tim Maia: O Síndico do Soul

Sebastião Rodrigues Maia, o nosso Tim Maia (1942-1998), era uma força da natureza. Com uma voz potente e rouca, um carisma avassalador e uma personalidade explosiva, ele foi o principal responsável por introduzir e popularizar a linguagem do soul e do funk no Brasil. Após uma temporada nos Estados Unidos, onde mergulhou de cabeça na música negra, Tim voltou com uma missão: fazer o Brasil dançar com um suingue diferente.

A música de Tim Maia era construída sobre a base rítmica do funk. Como vimos na série "Desvendando a Música", o ritmo é o que nos move. No funk, a ênfase está no "tempo 1" de cada compasso (o "one"), criando uma pulsação forte e hipnótica. Tim combinou isso com arranjos de metais poderosos e uma linha de baixo que era praticamente uma segunda melodia. Canções como "Não Quero Dinheiro (Só Quero Amar)" e "Do Leme ao Pontal" são exemplos perfeitos de sua capacidade de criar hinos dançantes e contagiantes.

Sua fase mais cultuada, no entanto, foi a "Fase Racional" (1975), quando, sob a influência da seita Cultura Racional, ele gravou dois discos de forma independente, com letras que pregavam a "imunização racional". Apesar do tema esotérico, musicalmente, esses álbuns são considerados o ápice do soul e do funk no Brasil, com uma qualidade de gravação e arranjos que eram de nível internacional.

"Descobri que o negócio é o seguinte: o agudo é pra vender disco, e o grave é pra fazer sucesso. O agudo é pra chamar atenção, e o grave é pra embalar."

- Tim Maia, em entrevista à Folha de S.Paulo, 1993.
Tim Maia no palco, cantando com energia, em uma imagem que captura sua presença magnética.

Tim Maia, o "Síndico", cuja voz e suingue ensinaram o Brasil a dançar ao som do soul e do funk.

Jorge Ben Jor: O Alquimista dos Ritmos

Se Tim Maia era a explosão do soul, Jorge Ben Jor (1942-) é o alquimista, um gênio singular que criou um estilo que não se encaixa em nenhuma prateleira. Sua música é uma fusão única de samba, soul, funk e ritmos africanos, tudo amarrado por um jeito de tocar violão que é só dele. Ele não toca acordes tradicionais; ele cria "levadas", padrões rítmicos e melódicos no violão que são a espinha dorsal de suas canções.

Jorge Ben começou na Bossa Nova, mas seu sucesso "Mas, que Nada!" já mostrava um balanço diferente. Nos anos 70, ele eletrificou seu som e, com a banda Trio Mocotó, criou o "samba-rock" (ou samba-soul). O álbum África Brasil (1976) é um marco, onde o violão de Jorge se mistura com a guitarra e uma percussão pulsante, criando hinos como "Taj Mahal" e "Ponta de Lança Africano (Umbabarauma)".

As letras de Jorge Ben são outro universo à parte. Ele mistura o cotidiano com o esotérico, fala de futebol, de alquimia, de mitologia e de personagens urbanos com uma linguagem poética e rítmica que é inimitável. Ele não apenas escreve letras; ele cria sons com as palavras, que se encaixam perfeitamente no seu groove.

Jorge Ben Jor com seu violão, sorrindo, em uma foto que representa sua energia positiva e seu estilo único.

Jorge Ben Jor, o alquimista rítmico que criou um gênero próprio, misturando samba, funk e poesia.

Tim Maia e Jorge Ben Jor provaram que a música brasileira podia ser dançante sem perder sua identidade. Eles criaram a trilha sonora para as festas e bailes de todo o país, influenciando gerações de artistas e abrindo caminho para a black music brasileira que floresceria nas décadas seguintes. Enquanto isso, uma outra vertente da música brasileira, que também bebia no rock, estava prestes a explodir e dominar as rádios e os estádios nos anos 80.

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